Aguarda para ser identificado
Na sala de autópsia
Coberto por um pano de cor indefinida
O Brasil
Caberá a artistas fazer o reconhecimento
Desse corpo:
Suas matas e rios
Seus bichos e céus
Mas também sua gente
Que lhe habita os intestinos e pulmões.
Depois de analisado
"É mesmo o Brasil quem morreu"
Deveremos enterrá-lo
Sem coroa de flores, homenagem ou cafezinho
Em vala comum, vala de brasileiro
Jogando sobre ele as terras todas
Quanto forem necessárias
Improdutivas e não-demarcadas
E deixá-lo ali descansando
Sem jazigo que o represente.
Creremos, nós artistas, que dali
Brotará quem sabe num futuro longíquo
Uma árvore que frutifique
Raízes alimentadas da ideia de Brasil
E dê de comer aos pássaros
Os novos habitantes desse lugar.
Depois de o Brasil morto e enterrado
Seguiremos com a lembrança do que
Poderia ter sido
E que nunca será:
Rememoriaremos o Brasil boa-praça
Jeito menino sempre sonhando alto
E pronto a ajudar quem lhe necessitasse.
Quem sabe no futuro
Não teremos um novo Brasil?
Um filho bastardo
Vivendo escondido nos rincões por aí
Disposto a ser ele mesmo:
Um outro Brasil.